a n A e seus equívocos

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20/07/2012

0.9

a n A  e seus equívocos
.
.

sentou-se no ponto de ônibus,

os olhos presos em lágrimas.



a fumaça das motos

impregna o ar

que lhe faltava.



obrigou-se a conter em si

aquela molhada vontade de fugir.



um homem gira a lâmpada

preenchendo de luz a janela do prédio escarlate,

a mulher do carro negro

freneticamente devora um cigarro no farol,

as cinzas caindo

as lágrimas voando

a bituca arremessada no asfalto

a n A  arremessando seu braço

aquele era seu ônibus…







perdeu-se nas lágrimas,

e esperou por mais de 40 minutos o ônibus que não viria…





caminhou,

apenas decidiu:

caminhar-se.

 

 .

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29/05/2011


0.8

a n A   e seus equívocos de sábado a tarde
.
.
os olhos fechou
as mãos suadas

lentamente começou a rodar,
acabara de entrar e 
só pensava em sair.


lentamente mais alto
o vento cortando o rosto
em looping uma caixinha de música.

pessoas rindo,
outras gritando.

a n A  imóvel
bailarina branca da caixinha de música,
girando, girando.

a mão direita segurando firme o ferro de proteção.

lembrou-se bebê
agarrada ao carrinho
a babá sacudindo-a rua a fora.

os olhos expremidos
o ar apertado
o sangue subindo
a bochecha vermelha
a explosão
o choro de virar quarteirão.


suas lágrimas derramadas sobre a fila,
lá embaixo,
as pessoas achavam que começara a chuviscar.


silêncio profundo,
só a caixinha de música
e o choro, que lá do alto
ecoava parque a dentro.


a n A  se debulhava
em lágrimas de lembrança
do alto da roda gigante.

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15/03/2011

0.7

a n A   e seus equívocos
.
.
como se chama o homem 
que
vende
bilhetes 
na bilheteria do metrô?

 b i l h e t e i r o m e t r ô m a n ?
 v e n d e d o r d e b i l h e t e s ?
o e n j a u l a d o v e n d e d o r ?

a n A dedicou-se por horas
em descobrir qual seria
O nome adequado.

não chegando a nenhuma
conclusão orgástica,
ela o batizou de:

"o l i n d o i n t o c á v e l"

a qualquer nome 
seria acrescentado:
"lindo"
porque ela se referia
especificamente
a um deles;

e não será  
a qualquer hora
em qualquer estação
que ele será encontrado,
não!

a n A, na consolação as 20h,
sempre comprava um unitário.
Ela sabia que

"o l i n d o i n t o c á v e l"

estaria lá
esperando por ela
com um ecstasy intralabial
sussurrando:
"boa viagem".

Todos os dias
era um unitário
olhar profundo
de quem quer se perder
dentro de alguém.




.

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13/09/10

0.6

a n A   e seus equívocos
.
.
Foi mijar
Fazer xixi
Foi a n A
a urina soltar
a bexiga relaxar.


Apertada,
uma mão desbotuou a calça jeans
a outra levantou a tampa da privada
(essa tampa tinha que estar fechada?!)


Doía
a bexiga
a vontade


Abaixou a calcinha
foi sentar
(o que?)
boiando estava
na água sanitária da privada branca
UMA LAGARTIXA DE PEQUENO PORTE.


dois eternos segundos
entre o olhar
a água
o cadáver frágil
(numa atitude estúpida, egoísta mesmo, sentei e mijei)


No sublime
daquele momento
de alivio,
a n A
estranhamente passou a sentir
o encontro com o cadáver;
o quentinho de seu xixi
envolvendo
o corpinho gélido da lagartixa.


por um instante
imaginou que tal encontro
pudesse ressuscitar a vida.
(dizem que a urina é um poderoso líquido vital)


Absorta ficou a n A
na tranfusão deste fluído.


limpou-se
vestiu-se
virou-se
olhou-se na água, morta e amarelada.


reflexionada levou a mão à descarga,
vidrados os olhos,
mandou a morte para o esgoto.


.

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23/04/10 

0.5

a n A  e seus equívocos
.
.
Fila.
Sala cheia.
Feriado de carnaval e o cinema lotado,
como compreender esse absurdo moderno?

Na última fileira
a n A avistou,
quase no meio,
a poltrona que lhe espera.

Avistou também
todas as pernas,
todos os pés,
o caminho que lhe separava de sua poltrona;
sua tão esperada,
tão desejada poltrona.

Com graciozidade passa pela
constrangedora situação
de pedir licença,
por favor,
pisar no pé de alguém,
desculpa,
perguntar se a poltrona está vazia
(mesmo vendo que ali não há ninguém).

Senta!
Se acomoda,
os preparativos habituais:
desliga os celulares (são 2),
veste o óculos de grau,
pega a blusa de frio,
põe a mochila no chão.

R E S P I R A !
Olha para a sua frente.

Passam 3 crônometrados minutos
e  a n A constata:
"não gostei do lugar"...

Olha
à direita
à esquerda,
um mar de pernas,
pessoas gordas,
pipocas,
refrigerantes,
sente-se a desgraçada em situação!

Suas mãos ficam de imediato geladas, molhadas;
o suor frio, tenso...

A mente lhe impõe a questão crucial:
Devo sacrificar o meu filme
para evitar o constrangimento de mudar de lugar?

Em um suspiro
acompanhado de um riso nervoso,
tímido, gracioso,
a n A pergunta para o cara ao seu lado:
"Vai ser muito engraçado se eu trocar de lugar?"




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04/04/10 

0.4

Em seus equívocos a n A foi ao médico.
.
.
O Motivo?
Inflamou-se no corAÇÃO.




- Há remédio, doutor?


- Para uma inflamAÇÃO
só mesmo um
inflar (da) ação.
Aciona-se por meio
de pilula colorida
o pulsar do corAÇÃO,
paraliza-o
e te eleva aos sonnhos mais
sublimes e ternos.


- E depois, doutor?


- Depois?
Normalmente
não existe depois.
São raros os casos
de sobreviventes ao
inflamar-se do
corAÇÃO.


Preferiu a n A
ficar na inflamAÇÃO.


Saiu do consultório,
passou na farmácia,
(comprou uma caixinha de lenços Softy's),
e foi ao cinema.




.

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07/04/2010


0.3

a n A   e seus equívocos
.
.
Os pés rolaram escada abaixo.




Com a respiração
que não cabe
em pulmões atrasados,
a n A se arremessou
para a rua
trancando rápido o portão.


Seus olhos avistaram:
o ônibus 177y
em constante velocidade
rumo ao ponto de ônibus!


O ponto que ela deveria estar,
O ponto que e l a n ã o e s t a v a.


Passo a passo
em constante velocidade,
a n A se atira
numa corrida irreversível
(uma bala que escapou do revólver).


Iludida em alcançar seu ônibus,
fica em meio a poeira da fumaça diesel.


O lenço florido
dos seus cabelos
voou ao vento,
caiu no asfalto.


.

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03/04/2010


0.2

a n A   e seus equívocos
.
.
Fechou os olhos,
pensou que gostaria de estar em qualquer lugar outro.

Imaginou-se
encontrando por acaso com uma pessoa
particularmente interessante,
no meio da multidão que caminha na Av. Paulista.
A surpresa
O inevitável abraço

O seu perfume invadindo as narinas dele
e inevitavelmente ele diria: 
"Nossa, que legal encontrar você!" 
(e ele só disse isso porque se sentiu tímido
em elogiar o perfume dela.)

talvez um café...
talvez um suco...
mais apropriado um sorvete?
ah, como eu gosto de tomar sorvete no outono!
(e ele ficou alegremente encabulado com esse comentário
percebendo que acertará em dizer s o r v e t e !)

Mas, não têm sorveteria na Av. Paulista,
pode ser um picolé de massa?
(e tudo está resolvido).

Passo   a    passo,
lentos e titubeantes 
se dirigem para um lugar qualquer
que possa lhes oferecer 
um picolé de massa.

Fazem disso 
u m l o n g o c a m i n h o.

Ela fixa seus olhos nos dele,
enquanto ele fala
entusiasmadamente
sobre qualquer coisa.

Os olhos que d e s n u d a m.

Os dele, fogem;
miram o chão,
os cabelos castanhos dela,
passam pelos olhos...

mas ela, ao desnudar-lhe,
torna-o tão frágil
que sua timidez surgue para impedir
que ele 
lhe roube 
u m b e i j o a g o r a,

um beijo instântaneo.

ela não o recusaria,
e graciosamente
fecharia seus olhos tão firme,
para sentir a plenitude do encontro
daqueles lábios tão macios e trêmulos...

Mas, ele apenas insiste em desviar o olhar,
buscar algum pensamento,
alguma palavra perdida...
enquanto ela olha e certeira sabe que 
ele
deseja beijar-lhe agora
n o m e i o d a r u a.



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01/04/10


 0.1


a n A   e seus equívocos
.
.
Ela joga chave dentro da bolsa sempre do mesmo lado.

Seus pés caminham titubeantes,
nunca certos
mudam o destino ao sinal de qualquer acaso;
Se vêem que do outro lado da rua
a calçada está coberta por flores amarelas e roxas
que caem das árvores,
(é início de outono)
os pés, atravessam;
não perdem a emoção de pisar em flores,
que mesmo desprovidas de vida
sustentam sua doçura.

O que são as flores 
senão um lembrete de que a vida também é frágil?
O acaso?
Ele está nos olhos dela: a n A.

Sua percepção sempre alterada
inventa motivos e razões, lógicas acrobáticas,
para reinterpretar o universo ao seu modo.

Si do seu olho direito se arremessa uma espontânea lágrima,
a n A revive instantaneamente A Dor
(já controlada, quase inexistente)
mesmo que o detonador da lágrima tenha sido 
simplesmente a poluição do ar
(que irrita a qualquer olhar).